Direito de Propriedade Intelectual - Resposta ao Rafael do canal Ideias Radicais

3/13/201722 min ler

Em seu vídeo, o Rafael já começa dizendo que propriedade é uma invenção, reconhecendo que isso é um conceito criado pelo homem, com parâmetros definidos ou redefinidos pelo homem, justamente para evitar conflitos. No entanto, ele acha que esse conceito deve se limitar ao que foi concebido no começo, sem poder ser atualizado ou adaptado a algo mais moderno, abrangente e justo. Assim é um grande erro achar que Propriedade Intelectual tenha necessariamente algo a ver com propriedade material, mesmo que se beneficie de alguns argumentos em comum, mas são conceitos tanto criados quanto distintos, apesar das semelhanças. Antes de replicar o Rafael, devo dizer que este texto será bem direto e sem papas na língua, mas quero deixar claro que, apesar de falar a verdade nua e crua, não tem o propósito de ofender quem quer que seja.

De cara, antes mesmo de introduzir o assunto, para você ter uma ideia de como são enganosos os argumentos contra a Propriedade Intelectual (PI) usados pelos libertários, veja o exemplo do Teorema do Macaco Infinito. Resumidamente, se um macaco ficasse infinitamente debatendo-se sobre as teclas de uma máquina de escrever, inevitavelmente, em algum momento, ele acabaria por produzir uma obra de William Shakespeare. Então poderia se perguntar quem foi o autor de Hamlet. Shakespeare ou o macaco infinito? Para começo de conversa, macaco infinito não existe, até porque, em toda a existência, nada é infinito, nem mesmo o universo, que um dia acabará em buracos negros. Não se pode usar uma hipótese irrealística para competir com algo real. Um autor vive em torno de 80 anos, e gasta um bom tempo de sua vida para produzir suas obras. Até onde sei, nenhum macaco vive mais do que o ser humano, e mesmo que alguma ONG ou qualquer outra empresa crie uma experiência científica para montar um macaco infinito, seja mecânico ou de outra tecnologia, com o propósito de testar se tal experiência produzirá uma grande obra de qualquer autor... bom, esse macaco não será infinito, de qualquer maneira. Acho que fui até longe demais com isso, mas penso que, agora, dá para ver claramente o quanto chega a ser ridículo o teorema do macaco “infinito”. Muitos outros “argumentos” também são.

Dia desses, fiz um teste de posicionamento político e, para minha surpresa, o resultado dizia que sou um libertário. Na verdade, não me considero libertário, pois discordo de algumas ideias do libertarianismo, no caso deste artigo, a questão da do fim da Propriedade Intelectual (PI), lei que os libertários rejeitam. Li alguns artigos no site do Instituto Mises sobre o tema e, para ser honesto, um desses artigos levantou questões importantes sobre problemas reais que existem nas leis de propriedade intelectual vigentes. Porém, este fato não dá suporte moral, nem pode ser usado, para sustentar a ideia de que não deva existir o Direito de Propriedade Intelectual. Neste texto, confrontarei os principais argumentos e questões levantadas, um a um, e quando oportuno, alguns argumentos do Rafael.

Esse é um assunto de suma importância, pelo simples fato dos libertários serem, hoje, os novos intelectuais que moldarão o futuro, por seu poder lógico de argumentação e, quase sempre, bem embasados. Porém, nenhuma doutrina está 100% correta, e é óbvio que o libertarismo (ou libertarianismo) tem suas falhas doutrinárias, que precisam ser corrigidas ou dirimidas com argumentos lógicos e realistas, antes que a doutrina torne-se dominante entres os jovens e mantenha pontos utópicos, que criarão problemas na sociedade futura que será moldada por esses jovens. Se, em algum momento no futuro, houver o fim da propriedade intelectual, isso causaria, de imediato, o desestímulo dos produtores de conteúdo em um mercado, que é hoje, cada vez mais crescente, o mercado de livros. Um escritor gasta tempo e dinheiro para produzir, que são recursos escassos, investe em serviços para uma boa capa, título, revisão para garantir a qualidade etc. Todo um conjunto de profissionais sobrevive da indústria do livro. Os eBooks, livros eletrônicos, vieram para facilitar o alcance que o escritor tem no mercado, tornando seu produto mais barato e acessível. O vislumbre de um mercado mais aberto, mais próspero e menos complicado, estimula ainda mais pessoas talentosas a desenvolverem suas obras. Vamos supor que, de repente, aparece um pessoal que não está nem aí para quem trabalha duro e sobrevive deste mercado, e diz: “Vou adquirir teu produto gratuitamente e você que se vire para sobreviver.” Ou pior, imagine alguém que dedicou anos para escrever uma obra de qualidade excepcional, investiu um monte de dinheiro nisso, esperando ter algum retorno, e um picareta simplesmente aparece e começa a ganhar dinheiro vendendo seu livro, sem lhe retornar qualquer participação. Ganhar dinheiro com o trabalho, esforço e tempo dos outros, é o que acontece no comunismo, socialismo ou sistemas similares. Qualquer pessoa de bom senso sabe que, em um cenário como esse, ninguém irá desenvolver novas ideias, ou livros, ou roteiros, ou softwares, a menos que seja um louco ou aficionado. Esse argumento se aplica com o mesmo peso para industria de games, filmes, pesquisas e desenvolvimento de remédios. Sim, propriedade intelectual é uma lei necessária em qualquer sistema capitalista. É por causa de todo o investimento feito com o propósito de atender a uma fatia do mercado e, claro, obter lucro, que essas coisas, mesmo sendo imateriais (informação), por natureza, são propriedades. Alguém pode se tornar dono de uma árvore por ser a pessoa que a plantou, cultivou e a fez crescer. Desta maneira, a árvore é sua propriedade, pois a existência dela se deve a ação de quem a plantou. Da mesmo forma, essa lógica se aplica a Propriedade Intelectual. Uma ideia complexa e bem elaborada, onde se aplicou tempo e outros recursos escaços para sua criação, é propriedade de seu autor. É por isso que, sim, o escritor pode ficar parado, recebendo royalties, por um longo tempo. Já existe uma regulamentação para que uma obra torne-se domínio público, é o que acontece após 30 anos de publicado. Adquirir a propriedade intelectual alheia gratuitamente é uma ideia erroneamente pregada por libertários, pois apropriar-se do que é fruto do trabalho e investimentos dos outros, é uma filosofia de esquerda, e tal ato produz o mesmo efeito que toda filosofia esquerdista produz, o desestímulo de quem investe, desenvolve e produz ideias para atender o mercado, e se beneficiar do sistema de trocas voluntárias pacíficas, o capitalismo.

Dizer que quem manda nessa questão é o mercado, como se o que importa é apenas a satisfação dos compradores, ou que quando o mercado está comprando pirateado (roubado), é porque o criador do produto está com uma má distribuição, são argumentos bem interessantes para quem rouba caminhões de mercadorias e vende mais baratos no mercado negro, afinal, os "clientes" (receptadores) estão satisfeitos. Se você me disser que não se pode roubar produtos físicos porque isso vai causar a agressão do prejuízo aos produtores, desestimulando-os a continuar produzindo, eu também posso dizer que não se pode piratear de quem produz livros, videogames, patentes de remédios ou outros itens, pois gerará prejuízo (violência) a quem investe dinheiro, tempo e esforço estudando para criar novas ideias e atender o mercado. O fim da propriedade intelectual, causaria um total desestímulo a todos que trabalham no desenvolvimento de novas tecnologias, de literatura, de games, e de tantas outras coisas que movem a humanidade para frente. Negar o direito de propriedade a seu autor, é querer socializar (ou comunizar) o empenho e empreendimento de quem desenvolve ideias.

Seguem, agora, algumas contradições na matéria do Instituto Mises ao tentar negar o valor e a importância da propriedade intelectual. Os argumentos apresentados, na superfície parecem razoáveis, mas, na verdade, são sofismas bem enganosos, e vou contestá-los aqui.

Título da matéria: “A propriedade intelectual é a chave do sucesso?”

Trecho: “eles defendem a propriedade intelectual como se isso fosse a verdadeira força vital de seus negócios. Eles deixam de dar crédito ao principal motivo: a sua própria criatividade, a disposição de assumir riscos e a suas ações geralmente baseadas no mercado.”

Réplica: O crédito do sucesso de alguém não está somente na criatividade de gerir um negócio de modo inovador, mas também na criatividade da própria ideia, a qual, muitas vezes, requereu investimento de tempo e outros recursos para ser criada.

Trecho: “a história do espírito empreendedor deixa de ser uma história heroica de riscos e recompensas e se torna mais uma história de decisões de escriturários de patentes e de advogados de direitos autorais.”

Réplica: Quem empreende um negócio, não está interessado em viver romanticamente uma aventura, como se estivesse tentando escrever, em sua própria vida, um roteiro de uma história de luta hollywoodiana, arriscando-se à frustração do fracasso. Que homem de negócio investiria tempo e dinheiro na criação de uma ideia, sabendo que esta poderia simplesmente ser tomada por outros, sem que pudesse se defender? Essa parece ser a argumentação de quem jamais investiu para criar algo. Só porque a patente ou autoria de uma ideia não garante o sucesso, é óbvio que isso não significa que ela não seja necessária para o sucesso de seu inventor.

Trecho: “ainda existe lucro e ganhos no comércio e o crédito ainda é dado a quem é devido”

Esse trecho, se refere a livrarias que vendem obras de domínio público, muitas das quais seus autores já morreram e, obviamente, fala de crédito no sentido de reconhecer o autor, não deles serem recompensados financeiramente por seu esforço, empreendimento, tempo e dinheiro empenhados no seu trabalho de desenvolver sua obra.

Por vezes o artigo distorce as cosias e substitui o termo propriedade intelectual, ou patente, por monopólio: “Deste modo a companhia possui agora três monopólios.” ao invés de dizer três patentes.

O artigo deturpa a coisa de tal modo que “transforma” a propriedade intelectual em um problema. O texto é tão ingênuo que usa argumentos que provam o contrário do que se tenta defender. Veja um trecho usado para tentar defender a pirataria: “Se fizeram alguma coisa, foi ter ajudado, já que a imitação é a melhor forma de elogio.” Réplica: Quem empreende uma ideia com o propósito de fazer negócios, não está nem um pouco interessado em elogios, já que isso não paga o tempo nem os recursos investidos. Também, não existe elogio maior, nem melhor do que a boa aceitação de seus produtos pelo mercado. Quando eles dizem que “o custo associado a estar atento aos imitadores existe, sendo a propriedade intelectual legalmente protegida ou não”, parecem convenientemente esquecer que a proteção legal limita, restringe e intimida a ação de imitadores ou plagiadores, tornando a “vigilância” bem mais fácil.

Outro argumento fajuto é: "A era da Internet tem nos ensinado que é totalmente impossível impor propriedade intelectual". Assim como é impossível impedir roubos de propriedades físicas, é impossível impedir o roubo de propriedade intelectual. Não se pode legitimar o roubo de algo só porque não é possível impedir que aconteça. Da mesma forma, só porque a Internet torna mais fácil o roubo de propriedade intelectual, este fato também não legitima o roubo.

Dizer que só os bens físicos podem ser propriedades por serem escassos, é tentar trazer a baila um argumento que não tem coisa alguma a ver com propriedade intelectual. É bom lembrar daquela história do presidente de uma companhia de cruzeiros que, após chamar vários mecânicos navais experientes, reclama de ter que pagar 1 milhão de dólares ao único que conseguiu fazer o navio funcionar, só porque ele fez isso dando apenas uma martelada. Quando o velho mecânico é perguntado se o que vai aparecer na nota de pagamento é “US$ 1 MILHÃO por uma martelada”, ele responde: “Não, amigo. Eu estudei muitos anos e gastei muito dinheiro para trabalhar nesse ramo. Ainda faço várias pesquisas e atualizações de conhecimento, inclusive de desenvolvimento de novas tecnologias, o que me consomem um bom tempo e dinheiro. Além disso, tenho décadas de experiência nessa área, o que também tem a sua representação de tempo e dinheiro consideráveis. Então, o que vai sair na nota de pagamento é “US$ 1 MILHÃO por saber onde dar a martelada”. Ele cobrou, não por simplesmente prestar um serviço, mas por aplicar os conhecimentos e as informações adquiridos ao longo de muitos anos. Dinheiro é poder, assim como a informação também é. Essas três coisas tem uma forte e inegável relação entre elas. Informações e ideias são tão palpáveis, que Richard Dawkins as classificou como seres vivos, em seu livro “O Gene Egoísta”.

Produtores de ideias que valham a pena o registro de patente ou autoria, não tiram essas coisas do nada. Não é como ter uma sacada momentânea e contar uma piada espontânea. “Ah, tive uma ideia, vou criar uma lâmpada elétrica. Vou pegar um vidrinho oco, colocar um fiozinho dentro, e assim fácil fácil, está pronto, uma lâmpada.” Muitos libertários tem uma mentalidade infantil o suficiente para comparar a escrita de um romance à “criação” de uma piada espontânea, como se fosse assim, num piscar de olhos, “Ah, tive uma ideia”. Um escritor passa messes, às vezes anos, desenvolvendo uma obra. Além do tempo, há o investimento de dinheiro para lapidar seu trabalho em diversos aspectos, isso para não mencionar as obras que gastam bastante dinheiro em pesquisas. Essa é uma das facetas fundamentais do capitalismo, pessoas que investem seus recursos agora, para colher os frutos no futuro, e é isso que muitos escritores fazem, incluindo a mim, neste momento. Tenho investido tempo e dinheiro, tanto na escrita quanto na lapidação de meus livros. Como já dito, tempo e dinheiro são recursos escassos, e você tem que admitir que, mesmo sendo imaterial, tempo é um recurso escasso, apesar de não poder ser uma propriedade, a despeito do fato de ser você quem decide como gastará seu próprio tempo. Ou seja, a escassez não é característica apenas de coisas materiais, logo, escassez não tem, necessariamente, relação com direito de propriedade, nem pode ser condição fundamental para se definir isso. Este fato derruba qualquer das argumentações baseadas na questão do “recurso escasso”. Se analisar a questão, sobre quem é realmente proprietário de recursos escassos como terras e suas riquezas, usando os argumentos do Rafael, que assina seu certificado de desonestidade intelectual (ou de falta de sinapses) ao minuto 6:04 do vídeo, dizendo que para ser dono de algo é preciso ter sido dono das coisas prévias, é possível provar que ninguém é proprietário de coisa alguma no Brasil, porque vivemos em terras que tomamos de seus “donos” “originais”. Ele fala que está tratando do assunto de modo filosófico e não utilitário. Pois bem, o que acabo de dizer aqui também é filosófico e, nesta esfera eclesiástica, incontestável. Isso é filosofia. Assim, ainda pode-se perguntar “o que te faz dono do seu corpo, se você nunca foi o prévio dono das moléculas que o compõe, sendo que você nem pode segurar tais moléculas no seu corpo, o que te obriga a estar constantemente substituindo-as?”, dessa maneira, o seu corpo ou qualquer outra coisa material seria sua propriedade, apenas se você fosse o inventor do Big Bang, se é que me entende. Então, o que pode ser propriedade ou não, é resultado de simples convenção humana, a forma como entendemos que é melhor para lidar com as coisas, sejam elas materiais ou imateriais. A vida prática é utilitária, não filosófica, até porque, por vezes, muitos pensamentos puramente filosóficos levam a conclusões impraticáveis, irrealísticas, e até insensatas, como é o caso do Macaco Infinito.

O artigo do Instituto Mises, que cito aqui, termina, basicamente, com uma declaração um tanto cínica: “considere um mundo sem marca registrada, direito autoral ou patentes. Este ainda seria um mundo com inovação - talvez com muito mais. E sim, ainda teríamos lucros para aqueles que fossem empreendedores”. Observe que, no final, ele menciona que ainda “haveria lucro para empreendedores”, pessoas que se beneficiariam do trabalho alheio, dos criadores. O que muitos libertários não entendem, não querem ou fingem não entender, é que o mundo e a tecnologia evoluem por conta dos criadores de ideias. Marcas, patentes e registros de autoria não têm nada a ver com “criar escassez artificial”, pois estes são mecanismos criados para promover um sistema de recompensa a seus criadores, estimulando-os a continuarem criando. Esse sistema também estimula o aparecimento de novos criadores, pessoas que fazem cursos superiores ou específicos, fazem pesquisas, se preparam, às vezes, uma vida inteira, para criarem uma nova ideia. No dia em que esses mecanismos forem extintos, os criadores de novas ideias, tecnologias, escritores de romances, se tornarão tão raros e, ainda assim, desvalorizados, quanto eram há alguns séculos, quando cientistas, poetas e escritores terminavam suas vidas doentes e na miséria. Leis de Propriedade Intelectual existem para ajudar a evitar que criadores e autores seja violentados por aqueles querem usurpar suas ideias e lucrar sem dar a devida recompensa aos autores. Tais leis são para evitar que criadores tenham o mesmo fim trágico de muitos no passado. E assim, como se usa da força para evitar o roubo físico, não se pode descartar o uso da força para evitar o roubo intelectual, roubo que é, sim, uma violência, pois usurpa o dedicado trabalho, tempo e dinheiro investidos pelos criadores. Todo libertário concorda que o roubo de algo físico, que custou em torno de um ou dois meses de salário do legítimo proprietário, é como se o ladrão tivesse transformado o proprietário em um escravo no tempo passado, usufruindo por ele de algo que lhe custou tempo e energia. É impossível dizer que não se pode usar a mesma analogia para pessoas que querem usufruir de algo que custou tempo e outros recursos de um escritor ou programador, sem o consentimento de tais. A base do capitalismo é a troca irrevogavelmente voluntária, e o capitalismo tem que preservar essa premissa, pois ninguém pode ser forçado a trabalhar de graça, mesmo num tempo passado por ocasião de roubo do que é fruto do seu suor, seja isso material ou não. As leis de PI evitam que sejam retirados dos criadores, suas perspectivas de sucesso e ganhos financeiros, para que eles não tenham o mesmo fim de Nikola Tesla.

É certo que a Propriedade Intelectual precisa de melhoramento em suas leis e regulamentações para garantir heranças culturais. Existem leis que permitem as obras tornarem-se domínio público, após alguns anos, mas manobras jurídicas protagonizadas por grandes companhias têm feito com que músicas de Elvis Presley ou dos Beatles não entrem nesse repertório de herança cultural, um proceder contestável que pode ser um pouco chato, mas mesmo assim não pode ser visto como motivo para extinguir a Propriedade Intelectual.

[IRONIC TONE ON] Ideias não são escassas, por isso não podem ter dono. É porque, por exemplo, desenvolver um software é algo tão besta quanto ter uma ideia qualquer, como criar uma piada assim, de relance, "ah, perai, tive uma ideia, vou apertar aqui um botão, e pronto", está criado um software completo para administrar um supermercado, sem investimento de tempo, nem de dinheiro. Porque você sabe, criar um software é como inventar uma piada, então se eu conto uma piada que outra pessoa inventou, a outra pessoa não vai deixar de ter a piada. É o mesmo quando eu pirateio um software, a outra pessoa não vai deixar de ter o mesmo software. Por isso que desenvolvimento de software não pode ser visto como um negócio a se investir, tipo quando um cara tem uma baita sacada no mercado, e tem uma ideia que pode atender a uma grande demanda que precisa de um software complexo e seguro, mas assim que estiver pronto, todos poderão copiar seus códigos que lhe custaram um baita tempo investido, assim como dinheiro, talvez noites sem dormir, e ele vai ficar na sarjeta porque não pode ganhar nada com aquilo que não lhe pertence, pois ideias não podem ter dono. Não vale a pena desenvolver software como meio de negócio. Esses gênios deverão ter o mesmo fim de muitos gênios do tempo da idade antiga, que morreram pobres e na sarjeta. Isso faz todo sentido. [IRONIC TONE OFF] Só um adendo aqui: Sei que, a partir de hoje (15/08/2023, data em que estou republicando esta matéria no blog de meu site oficial) a inteligência artificial tornará a criação de software em algo quase tão fácil quanto apertar um botão, e só porque muitos textos, desenhos, músicas etc, criados por IAs, são disponibilizados para uso livro e gratuito, isso não invalida o direito de propriedade intelectual das pessoas que fizeram suas criações pelo próprio esforço.

É esquisito alguém dizer que não é um problema uma pessoa copiar um livro que escrevi porque eu não vou deixar de ter o livro, convenientemente esquecendo-se de que eu não escrevi o livro para simplesmente tê-lo comigo, mas para fazer negócio e construir uma carreira. Em um período de 7 meses, escrevi um livro de ficção, meu primeiro romance (está linkado na coluna à esquerda). Adicione mais 2 anos investindo em torno de R$5 mil em serviços para aperfeiçoar o texto, além do meu tempo gasto em rever minha ficção. Eu sou capitalista, e escrevo olhando para isso como uma forma de negócio a se investir, pois confio no meu talento, e sei que, quando meu romance estiver em inglês e espanhol (mais investimentos) vou conseguir o sucesso e retorno financeiro que mereço, vendendo o que é minha propriedade intelectual. Quem conhece um pouco da Escola Austríaca (não pense que concordo com tudo que eles dizem), deve saber o que é Taxa de Retorno e, como empreendedor, é isso que eu vislumbro ao fazer investimento e criar algo que é meu. [ANGRY TONE ON] E se algum espertinho plagiar, roubar, ou tentar ganhar dinheiro em cima do meu suor sem minha devia autorização, juro que vou caçar este parasita até no quinto dos infernos! [ANGRY TONE OFF]

A quem vier falar de software livre como argumento para refutar a PI, saiba que este argumento não é válido. As licenças copyleft não se aplicam nessa argumentação, justamente por serem licenças concedidas por sues criadores. É estranho ver libertários, que são capitalistas, usando o software livre para argumentar, pois isso está mais ligado ao socialismo do que ao capitalismo! É bem esquisito um capitalista defender a socialização de um produto. Também, lançar um software livre tem a ver com a liberdade do programador, assim como alguém pode doar seu dinheiro a quem quiser. Isso não legitima a apropriação de um software sem a autorização de seu criador.

Quem lança software livre ganha dinheiro com Software as a Service. Mas aqui vai uma pergunta para outro tipo de produto: Como o produtor do filme do Homem de Ferro poderia ganhar dinheiro com serviço? Essa questão foi levantada numa discussão no youtube. Algumas ideias infantis, e outras malucas, surgiram para contestar. Uma delas, foi a ideia de cada empresa de filme ter suas próprias salas de projeções e ganhar dinheiro com ingressos para a exibição do filme. Uma total ingenuidade que só complicaria tudo: As salas de exibições ficariam limitadas a exibirem apenas os filmes de suas próprias produtoras, além das empresas de filmes serem obrigas a manter esses cinemas e funcionários, mesmo enquanto ainda não tivessem seus filmes prontos para serem exibidos. Imaginando outra situação libertária, como seus filmes não seriam suas propriedades, haveria a preocupação de suas obras vazarem até mesmo antes de serem lançadas, e as salas de exibições das empresas concorrentes começarem a ganhar dinheiro com o que elas não moveram uma palha para produzir. Além desse modelo de negócio tornar tudo um investimento de altíssimo risco, faria com que a industria do cinema fosse um negócio tão engessado, que seria inviável empreender nesse ramo. No capitalismo, a razão de como algo se estabelece, quase sempre, é porque foi a melhor forma para facilitar as coisas e se fazer negócio de modo prático. É por isso que os filmes são propriedades intelectuais, para facilitar sua distribuição a qualquer um que tenha uma sala de exibição, sem necessidade de pertencer a qualquer outra empresa, permitindo a cada parte ter sua participação devida de lucro, nesse sistema de trocas voluntárias. O fim da propriedade intelectual só criaria mais problemas, ou mesmo inviabilizaria os negócios. Outro exemplo são as pessoas que investem em invenções e criam novas tecnologias. Essas pessoas, visando o mercado, muitas vezes investem anos desenvolvendo uma nova ideia revolucionária e bem à frente de seu tempo. Quando tudo pronto, registram a patente e saem procurando por investidores, mostrando para vários deles ao mesmo tempo, tendo a liberdade e o conforto de que ninguém irá roubar seu invento sem lhes dar o devido retorno por seus investimentos. Alguns ancaps já especularam que tal empreendedorismo de inventores seria perfeitamente possível sem lei de patentes ou que protege propriedade intelectual, fazendo um contrato para que o investidor não propagasse ou usasse a ideia dele, mesmo que não concordasse em investir. Olha só como isso engessa e dificulta as coisas, pois o inventor teria que convencer o investidor de assinar um contrato antes mesmo de ver seu invento, o que nem mesmo impediria impedir que tal empresário usasse tal tecnologia em secreto na privacidade de sua indústria, se fosse o caso.
Assim como jogos, filmes não podem ser vistos como serviços para entreter, pois estes são produtos para entretenimento, e tudo fica mais fácil quando eles tem suas patentes e registros protegidos. Alguns já tiveram a ideia de usar crowdfunding como meio de levantar recursos vindo de fãs para uma produção. Mas o problema nisso é se os investidores (contribuidores) teriam condições de avaliar o projeto, se seria algo realmente bem feito ou se valeria mesmo a pena. Isso, talvez, fosse bom para pequenas fanfictions de coisas que já existem, mas dificilmente uma nova ideia seria patrocinada com recursos suficientes para uma grande produção como AVATAR, por exemplo, que gastou centenas de milhões de dólares e criou até novas tecnologias para ser produzido. E quais seriam os fãs de AVATAR para um crowdfunding, antes do filme ter sido lançado? A industria de filme, hoje, é um mercado de bilhões, onde muito poucas produções feitas em fundo de quintal farão sucesso. AVATAR teve milhões investidos, engenheiros e técnicos altamente especializados, uso de equipamentos caros e sofisticados, e nada disso seria feito com um crowdfunding, tipo de arrecadação que tem sido usado até para cavar buracos, e é para aí que iria toda a industria de filmes se acabassem com a propriedade intelectual e tentasse produzir filmes com crowdfunding, onde os ingênuos pagariam para muitos espertinhos esperassem sentadinhos em suas casas e assistirem de graça. Eu adoro X-Men, mas não pagaria um centavo para produzir, sabendo que outros assistiriam de graça às minhas custas. Esse é um problema que, assim como os socialistas, muitos anarcocapitalistas têm: A mentalidade infantil de imaginar uma realidade irrealística. São crentes que não conseguem enxergar as falhas em suas crenças. Para eu investir, preciso ver a possibilidade de lucrar com meu investimento. É por isso que o fim da propriedade intelectual acabaria com a industria de filmes, ou a tornaria em coisa de fundo de quintal, pois isso afastaria dessa industria os grandes investidores, desenvolvedores de tecnologia, profissionais de alto gabarito, etc, já que eles não poderiam lucrar o suficiente com algo que seria "distribuído" de graça.
Como muitos brasileiros se contentam facilmente com a aquisição de porcaria, a pirataria aqui é bem grande, e muitos compram verdadeiros lixos, onde ele vai "ver o filme" que foi gravado com uma câmera de mão (tremendo e, as vezes, sumindo a imagem, porque o ladrãozinho está se escondendo do lanterninha). Tem muito brasileiro que não dá valor a seu dinheiro suado, e fica sustentando esses ladrões que vendem lixos pirateados. Não sou hipócrita de dizer que nunca comprei pirata, mas foi assim que eu descobri o quão idiota eu estava sendo. Jamais pagarei um centavo novamente, para quem vende porcaria. E mesmo os DVDs "bem copiados", não tem nada do que eu gosto, como o filme em outros idiomas, as cenas deletadas, making off, entrevistas, etc. Essa gente que compra pirata não leva Hollywood a falência, porque países onde as pessoas têm respeito por si mesmas, não gastam seu dinheiro com porcaria e têm a consciência de que seus recursos vão manter essa industria produzindo o que há de melhor.

Alguns já disseram que se alguém quer proteger informações como sendo um produto, deveria criar algum sistema de proteção eficiente, assim como o sistema de bitcoin, ao invés de criar leis coercivas. Sim, moedas são propriedades, seja isso eletrônico ou não. As bitcoins têm todo um sistema de segurança ultra eficiente para não serem roubadas. A dificuldade de se ter uma proteção tão eficiente para músicas e filmes, é que esses são produtos que precisam ser distribuídos. A diferença entre as moedas e os produtos, são apenas suas funções e seus sistemas de proteção. O que alguns não entendendo, é que a demanda confere um valor a essas produtos eletrônicos. É este valor que estimula quem produz a continuar criando. Acabar com a propriedade intelectual é perverter o valor destes produtos, o que leva a extinção de quem produz coisas que o mercado deseja. O que muitos não querem é encarar o fato de que, o roubo de propriedade intelectual tem vítimas visíveis e nomeáveis, os autores e seus sócios. Se não houvesse propriedade intelectual, haveria uma quebra de muitos setores prósperos da economia, efeito idêntico ao das políticas socialistas. A propriedade intelectual é parte natural do capitalismo, simplesmente por causa da demanda no mercado e os investimentos feitos para produzir. Não há argumento plausível para justificar o roubo do esforço e empreendimento alheio. Ou alguém acha que foi justo o pagamento indecente a quem “criou” o logo da página Humaniza Redes, que foi copiado? Num cenário onde não existe PI, imagine se uma das editoras para as quais J. K. Rowling apresentou Harry Potter, antes de publicar, conseguisse alguém que escrevesse de forma mais envolvente, e colocasse o livro no mercado primeiro, com um poder de distribuição maior que a autora, pobre e sem recursos. Como J. K. Rowling, criadora original de uma série de conceitos e ideias fantásticas, poderia comercializar as suas histórias sem prejuízo? O que há de ético ou moral, em atender uma demanda de mercado com o que foi esforço dela, sem lhes dar nada por isso? – Obrigado a Lane Hawkins, por este argumento com J. K. Rowling.

Não se pode pensar que a propriedade intelectual foi destruída com a popularização da Internet. Ela só ficou mais suscetível aos ladrões, assim como contas bancárias, cartões de crédito, e outros meios eletrônicos de mover o dinheiro. Novamente, não é porque uma coisa ficou mais fácil de se roubar, que isso legitimaria o roubo. Toda patente tem uma vida útil, período no qual seus inventores podem lucrar com suas ideias em tempo como proprietários. Enquanto esse prazo estiver valendo, os furtadores de ideias proprietárias não deixam de ser ladrões, só porque a internet tornou o roubo mais fácil. A teoria da propriedade privada, quando foi criada, não previu que um grande mercado disposto a comprar ideias se formaria no futuro. Então essa bobagem de propriedade valer apenas para bens físicos, não significa coisa alguma, é obsoleta, tanto é, que foi no próprio sistema capitalista que a Propriedade Intelectual se estabeleceu.

Resumindo, o fim da PI causaria, no mercado de ideias (sim, existe um mercado de ideias), o mesmo efeito que o comunismo causa em qualquer mercado. Ao passo que outras pessoas enriqueceriam com ideias que eles não criaram, nem tiveram qualquer trabalho ou custo para isso, os gênios criadores de tais ideias iriam desaparecer paulatinamente, até que não se teria mais nenhum produtor criativo, o progresso humano seria reduzido ou estagnado, causando danos sem precedentes ao progresso da própria sociedade, assim, os parasitas do esforço alheio também desapareceriam. O Fim da Propriedade Intelectual é um erro do pensamento libertário. É muito fácil para o Rafael, do canal Ideias Radicias, ser contra a PI, sabendo que seu fim criaria muitos problemas, e ainda assim, simplesmente dizer que não sabe as soluções, como se isso não tivesse importância. Esse é o típico argumento “encerrador de assunto”, muito usado no sofisma de quem não tem mais argumentos. Quem acha que PI é errado, ou um problema, é obrigado a mostrar de que maneira seria melhor sem ela, para validar o que se diz. Mas eles não mostram simplesmente porque não é possível resolver os problemas criados. PI é tão necessária quanto benéfica. O Sr. Mises não está certo em tudo.

Antes que alguém venha me falar sobre a Netflix, é bom lembrar o fato de que esta empresa faz acordos com os estúdios proprietários dos filmes, e lhes pagam royalties.

Um forte abraço e até a próxima.

Sean